A Constituição de
1988 já está ficando velha, mas ainda encontra muitas resistências na
sua efetivação. Está elencado entre os direitos fundamentais assegurados
a todos “o acesso á informação e resguardado o sigilo da fonte, quando
necessário ao exercício profissional”. Não satisfeito com essa forma
genérica o legislador constitucional repetiu-o de forma ainda mais
didática que “todos têm direito a receber dos órgãos públicos,
informações de seu interesse particular, coletivo ou geral, que serão
prestados no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvados
aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do
Estado”.
Nos países mais desenvolvidos como Estados Unidos,
Suécia, Finlândia esse acesso tem sido garantido por normas
democratizadoras de acesso à informação que permitiram dentre outros
feitos históricos a derrubada por renúncia de do Presidente Nixon dos
EUA e, no Brasil, tem ajudado a descortinar os segredos que mantiveram
no escuro a mais sangrenta ditadura militar de nossa história.
No Brasil a Lei 8.159, de 8 de janeiro de 1991, disciplinou esse tema
foi promulgada com o objetivo de “ assegurar o direito fundamental de
acesso à informação.... com a observância da publicidade como preceito
geral e o sigilo como exceção” e visa dentre outros objetivos “fomento
ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública,
divulgação de informações de interesse público”
Prescreve o
artigo 4º da citada lei que “todos têm direito a receber dos órgãos
públicos informações de seu interesse particular ou de interesse
coletivo ou geral, contidas em documentos de arquivos, que serão
prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas
aquelas cujos sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do
Estado, bem como à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da
honra e da imagem das pessoas.”
Os estudiosos e pesquisadores
desse tema reforçaram a ideia de que o exercício de cidadania não está
limitado somente ao direito de voto. Para se legitimar esse ato [o da
cidadania], os cidadãos[brasileiros] têm que se conscientizar que é um
direito legítimo e assegurado pela“Constituição Cidadã” conhecer, não só
as atividades de funcionalismo público, mas também sua produção
documental, seus arquivos, ou seja, todas as transações comerciais ou
não implementadas pelo governo, que por sua vez são documentada se
arquivadas nessas repartições públicas.
O direito à informação é
aquela contemplada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, ou
seja: o direito à informação é uma garantia fundamental que toda pessoa
possui para atrair informação, informar e ser informada. Villanueva
(1998), apud Díaz (2004, p.64),define estes três preceitos – atrair
informação, informar e ser informada, como:
“- el derecho a
atraerse información incluye facultades de acceso a los archivos,
registros y documentos públicos; así como la decisión de qué medio se
lee, escucha o contempla;
- el derecho a informar incluye las
libertades de expresión y de imprenta: así como la constitución de
sociedades y empresas informativas;
- el derecho a ser informado
incluye facultades de recibir información objetiva, oportuna y veraz, la
cual debe ser completa y con carácter de universal – que la información
sea para todas las personas sin exclusión alguna.”
O direito à
informação está contemplado no artigo 19 da declaração Universal dos
Direitos Humanos aprovada pela ONU desde 1948: “ Todo indivíduo tem
direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica de não ser
inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem
consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de
expressão”.
O direito de acesso à informação pública e sua
transparência chegou à América Latina sob o atrativo de diminuir
a corrupção, otimizar a eficiência das instâncias governamentais e
melhorar a qualidade de vida das pessoas, ao dar a estas a possibilidade
de utilizar as leis de acesso e transparência como ferramentas para
enriquecer seus conhecimentos na tomada cotidiana de decisões. Porém
existem considerações de peso que explicam a incipiente sociedade civil
latino-americana[assim como a sociedade brasileira]: a) o comum é que
haja organizações que promovam os direitos humanos ou as liberdades
civis como um todo, mas não há muitos espaços apropriados para debater e
defender o acesso à informação pública, nem tampouco os criou como
áreas para a sociabilização do conhecimento; b) é importante assinalar
que não basta importar modelos estrangeiros, alheios à realidade
latino-americana, mas tão pouco é suficiente elaborar modelos normativos
baseados somente no conhecimento local sobre o tema; o que parece
adequado é combinar os parâmetros democráticos internacionais com a
realidade de cada país latino-americano; c) os meios de comunicação de
diversas partes da região têm dado uma cobertura informativa irregular
aos esforços desenvolvidos para promover normas jurídicas sobre a
matéria; d) não existem esforços em produzir conhecimento científico
sobre a matéria, circunstância que reduz a capacidade de argumentação ao
apoiar movimentos sociais que traduzem em leis e instituições as ideias
e motivações que sustentam a pertinência do direito de acesso à
informação pública.
A Constituição de 1988 ofereceu dispositivos
fundamentais à instalação de um novo patamar jurídico para o acesso à
informação governamental e o direito à transparência do Estado. Os
direitos do cidadão passaram a ter como contrapartida os deveres da
administração pública no sentido de viabilizar o acesso à informação.
Como previsto no artigo 216, parágrafo 2º: "cabem à administração
pública, na forma da lei, a gestãod a documentação governamental e as
providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem".
O direito de procurar, receber e disseminar informação impõe uma
obrigação positiva aos Estados de assegurar o acesso à informação,
particularmente em relação às informações retidas pelos Governos em
todas de armazenamento e sistemas de recuperação.
No relatório
sobre promoção e proteção do direito de liberdade de opinião e expressão
– 1998 ficamos estabelecidos que “O acesso à informação é mecanismo
necessário para consolidação da democracia. Através deste direito o
cidadão é capaz de acompanhar as ações do governo que age em seu nome,
além de consistir em um mecanismo importante contra a ineficiência,
esbanjamento e corrupção.”.
Todo esse comentário doutrinário
faz-se necessário porque fui procurado em meu gabinete de trabalho pela
Dra. Daniele Gomes de Moura, uma ilustre pesquisadora e escritora que
recentemente defendeu uma tese de mestrado sob o tema :”Do abandono
afetivo à adoção unilateral: Respostas Judiciais. Alienação parental”
que pediu-me que a ajudasse a continuar suas pesquisas visando agora sua
tese de doutorado sob o mesmo tema, agora, após a promulgação da Lei de
Alienação parental.
Ora esse é um tema recorrente nos tribunais
do país e necessário aprofundar seu conhecimento por todos os agentes
que lidamos com o direito e à sociedade em geral. Interessa, sobretudo à
causa das crianças e adolescentes, principais vítimas dos conflitos
entre os pais. Muitas vezes as crianças são usadas como moeda de troca
nos conflitos de interesses entre adultos.
Como sempre facilitei
o acesso á informações a todos os estudiosos e pesquisadores quando na
titularidade da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso, coloquei-me á
disposição da doutora, pensando estar cumprindo uma mera formalidade de
intermediação.
Mas logo fui surpreendido por um processo
kafkiano inexplicável. Tive minha solicitação apreciada por um juiz
auxiliar, que rigorosamente deveria estar dando conta de seu múnus
judicante e não servindo de parecerista, já que qualquer aluno da EMERJ,
ou um funcionário do próprio tribunal melhor qualificado faria melhor e
não subtrairia da Presidente a quem me dirigi o dever de apreciar e
decidir uma questão levada à Presidência por um desembargador.
Assim decidiu o auxiliar parecerista: ”Tendo em vista o sigilo imposto,
impossível atender. Encaminhe-se o expediente para ciência, após
arquive-se”. Inconformado com esse ato de descaso e desrespeito ás
funções que exercemos, solicitei a manifestação da Presidente, a quem me
havia dirigido, ressalvando que a Desembargadora Leila Mariano, que
recém havia deixado a Diretoria da Escola da magistratura do Rio de
Janeiro, entidade educacional e formadora de magistrado que estimula a
pesquisa e as produções literárias e científicas voltadas para o
aperfeiçoamento da doutrina, melhor se posicionaria sobre o pleito da
pesquisadora.
Não tive melhor sorte. Colocando de lado a
necessidade de estudos aprofundados no tema versado, o interesse
superior da criança e do adolescente que deve ser visto com prioridade
absoluta sobre todos os demais interesses, o texto constitucional que
atribui à categoria de direito fundamental o acesso á informação, para o
qual o legislador criou um remédio jurídico semelhante ao habeas corpus
e o mandado de segurança e assim decidiu; “Aprovo o parecer. Mantenho o
indeferimento. Ciência ao requerente.”.
Decidiu quem pode,
obedece quem tem juízo. Diz o dito popular. Não cabe recurso, mas cabe
lamentar e publicar no meu blog www.blogdosirodarlan.com e onde mais
couber para que outros brasileiros tenham acesso à informação e façam
seu próprio juízo de valor. Afinal, vivemos numa democracia ou
pretendemos que assim seja.
* Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Membro da Associação Juízes para a Democracia
Fonte: http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2013/03/31/direito-a-informacao-e-direito-fundamental-da-pessoa-humana/
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado pelo comentário!