quinta-feira, 21 de junho de 2012

STF não atende pedido da Lei de Acesso à Informação

Paulo Victor Chagas
Do Contas Abertas
 
O Supremo Tribunal Federal (STF), instância máxima do Poder Judiciário, ainda não cumpre totalmente a Lei de Acesso à Informação, que passou a valer em todos os órgãos públicos no último dia 16 de maio. A Lei nº 12.527/2011, que representa um marco em favor da transparência e da divulgação de informações no país, ainda não foi regulamentada na Suprema Corte, e por este motivo o STF não atendeu a demanda registrada pela Associação Contas Abertas.
O Contas Abertas entrou em contato com o Supremo para solicitar informações a respeito das viagens internacionais realizadas pelos seus ministros em 2012. A intenção era saber os períodos, os destinos, as finalidades e o valor das diárias recebidas nos deslocamentos para o exterior. Em resposta, o secretário de Administração e Finanças do STF, Anderson Vidal, informou que o atendimento à demanda só seria efetivada quando a legislação fosse regulamentada internamente.
“Considerando o deliberado na Sessão Administrativa de 6/6/2012, de que a Lei nº 12.527/2011, ‘Lei de Acesso à Informação Pública’, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, será objeto de regulamentação pela Comissão de Regimento, aguarde-se a edição do respectivo regulamento, para o fornecimento das informações solicitadas”, respondeu o STF, em comunicado enviado ao Contas Abertas em 15 de junho, um dia antes da solicitação completar trinta dias.
Sancionada pela presidente Dilma Rousseff em 18 de novembro de 2011, a Lei de Acesso à Informação entrou em vigor apenas seis meses depois, no último dia 16 de maio, a fim de que órgãos integrantes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, fundações e empresas públicas, sociedades de economia mista, e demais entidades da União, Estados, Distrito Federal e Municípios pudessem se adequar às suas determinações.
Para o especialista em transparência pública e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas, Fabiano Angélico, o prazo dado pela lei serviu justamente para que houvesse diagnóstico e fosse criada comissão que apontasse as necessidades para implementação. “Isso é um absurdo. A ideia é que na data de entrada prevista para a entrada em vigor da Lei tudo já estivesse pronto”, afirma.
“É lamentável que o Poder Judiciário, conhecido como uma das principais ‘caixas pretas’ do Brasil, não tenha feito nada nesses seis meses e agora nas últimas semanas tenha criado comissão para começar a pensar e estudar o assunto”, afirma. De acordo com resposta do STF, o destacamento de comissão para a regulamentação da Lei foi decidido em reunião realizada somente no dia 6 de junho.
Fabiano Angélico comenta que a falta de regulamentação não deveria servir como argumento para negar respostas. “A Lei é Federal e bastante clara ao dizer que vale para todos os poderes. O que ela determina que seja regulamentado por cada um dos poderes especificamente são dois aspectos básicos, como o sistema de apelação [órgão recursal] e a estrutura física ou eletrônica para pedido de informação [Serviço de Informação ao Cidadão - SIC]. Todo o resto já está valendo”.

Viagens internacionais
O Contas Abertas teve acesso, por meio do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), à relação de viagens realizadas por funcionários e ministros do Supremo nos anos 2011 e 2012. Graças a esse sistema, reproduzido pelo Siga Brasil, do Senado Federal, e não por meio da Lei, foi possível encontrar, por exemplo, gastos com viagens realizadas pelo então presidente do STF, Cezar Peluso, à Europa. O ministro participou, em Bellagio, norte da Itália, de fórum sobre o estabelecimento de Universidade de Segurança Pública da ONU no Brasil. O evento, de acordo com o portal de notícias do Supremo, ocorreu de 4 a 8 de abril do ano passado, e para isso há o registro, no Siafi, de pagamentos de diárias internacionais entre 02 e 04 do mesmo mês que somam cerca de R$ 7,4 mil.
A participação do ministro Gilmar Mendes no congresso internacional em homenagem ao jurista italiano Antonio D’Atena, na Universidade de Granada, na Espanha, também foi registrada nas despesas da Suprema Corte. O período que o ministro recebeu para utilizar diárias no país vai de 12 a 16 de abril de 2011, chegando ao valor de R$ 3.930. Recentemente, foi colocada em discussão a possibilidade de Gilmar Mendes ter viajado a Europa “de carona” com o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) durante esse período, hipótese comprovadamente negada pelo ministro.
Apesar dos levantamentos realizados pelo Contas Abertas apresentarem, em alguns casos,  valor, destino e duração das diárias, a informação não detalha as finalidades das viagens. Além disso, o acesso ao Sistema requer avançado conhecimento técnico sobre orçamento que muito difere da determinação da lei de que a informação deve ser de fácil compreensão. Ademais, a tabela apresenta a execução apenas das diárias, e não das passagens e conexões dos ministros.
“Claramente esse tipo de informação [sobre viagens], se divulgada, não vai colocar em risco a segurança nem a saúde de ninguém. Não se trata de informação de caráter sigiloso, pelo contrário, o intuito é permitir mais clareza acerca das atividades de juízes, o que é fundamental para o controle democrático e social”, contesta Fabiano Angélico.

Outros tribunais seguem exemplo do Supremo
Assim como o STF, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) também não encaminharam respostas solicitadas pelo Contas Abertas. As Cortes alegaram que estavam em período de adaptação do SIC, em momento de criação de regulamento.
Ao TSE também foi pedido detalhes sobre as viagens realizadas pelos seus ministros. Após o registro realizado no dia de entrada em vigor da Lei, o TSE respondeu horas depois que a Assessoria de Assuntos Internacionais (AIN) seria o órgão responsável por tratar do assunto e, portanto, responder aos questionamentos. No entanto, a Lei de Acesso, em seu Art. 11, § 1º, prevê que o órgão ou entidade que receber o pedido deverá remeter o requerimento aos detentores da informação.
Questionada, a assessoria de imprensa do Tribunal respondeu que somente no dia 22 de maio foi assinada uma portaria regulamentando internamente a Lei. O documento, assinado pela presidente do TSE, ministra Carmen Lúcia, criou o Núcleo de Informação ao Cidadão, responsável por atender as demandas dos cidadãos e autorizar o fornecimento das informações.
O STJ também estava em período de adaptação quando a Lei entrou em vigor. O e-mail da ouvidoria do Tribunal estava desativado no momento, o que fez com que a solicitação do Contas Abertas não fosse sequer respondida, a não ser por mensagem automática informando a forma de contato por meio de formulário eletrônico no site.
Após ser questionada acerca de falta de respostas, a ouvidoria do STJ pediu que o CA encaminhasse novamente o pedido e justificou que a solicitação não havia sido realizada da maneira correta. No entanto, o site do Tribunal informa que o e-mail também é um canal de informação.

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