sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Por mudanças no Arquivo Nacional e pela boa gestão da informação pública do governo

O ano era 1992. Collor ainda era presidente, a internet era coisa de nerd de faculdade e a web nem existia. Este foi o último ano em que a presidência da república, ainda comandada pelo caçador de marajás, indicou o diretor do Arquivo Nacional. Nos últimos 22 anos, muita coisa mudou. O Brasil venceu a inflação, passou de coadjuvante internacional a ser um dos principais atores econômicos mundiais. Mas nada mudou no arquivo nacional, mesmo depois de três mandatos consecutivos do governo popular do PT, a gestão do órgão responsável por gerenciar a informação ficou relegada a um segundo plano.
O Arquivo Nacional (AN) tem um papel estratégico na gestão da informação federal. Era pra ser a principal estrutura num sistema de trâmite informacional, no planejado Sistema Nacional de Arquivos. Este seria o órgão central do SIGA, sistema que deveria gerir a gestão arquivística nos órgãos executivos do governo federal, e que vem agindo à margem de suas atribuições, por pequenez e esgotamento do modelo de gestão ainda adotado no século passado.
O AN tem potencial para ser um centro de conhecimento de diversas áreas que atuam na gestão como da própria área de Arquivologia e outras como História, Biblioteconomia, Ciências Sociais, Química, Biologia, Patrimônio, Memória, Restauração, além de ser um epicentro para pesquisas em documentos filmográficos, sonoros e cartográficos. Apesar disso e de sua vocação de equipamento cultural numa área degradada do centro do Rio de Janeiro, a instituição permanece fechada em torno de si mesma, sem constituir-se como centro de excelência em nada, sem buscar novos públicos, sem diálogo com escolas e com a juventude e, principalmente, sem cumprir sua missão junto ao Estado Brasileiro. É comum o portal do Arquivo Nacional sair do ar na sexta-feira e voltar só na segunda, como registrado por reclamações de diversas fontes.
Agora um movimento criado por membros da sociedade civil, chamado Muda Arquivo Nacional, pretende mostrar à equipe de transição governamental e à presidenta Dilma a importância deste organismo de gestão. Este movimento tem diversas propostas, a primeira dela é sugerir a troca do diretor, pois não há mandato que seja criativo e inovador em 20 anos de atuação, os sinais de esgotamento são claros. O movimento sugere que de preferência a próxima diretoria do AN tenha mandato determinado, além de participação de funcionários na definição. Outras propostas incluem a Regionalização do Arquivo Nacional por meio da criação de escritórios de representação, fortalecendo o Sistema de Gestão de Documentos da Administração Pública – SIGA e possibilitando a orientação para gestão de documentos públicos federais nos estados. Seria um alento frente à falta de iniciativa na área nos últimos sete mandatos presidenciais.
Outro fator claro de esgotamento foi a realização da Conferência Nacional de Arquivos, que mobilizou as instituições e profissionais da área, encaminhou muitas resoluções e na prática quase nada foi implantado. Políticas simples que poderiam arrumar a casa e colocar o sistema a funcionar foram desconsiderados pela atual direção. A situação atual do Arquivo Nacional é crítica. O país precisa decidir se realmente deseja avançar no sentido do pleno acesso à informação pública, o que demanda um grande esforço de gestão de documentos e informações. Na atual conjuntura, o Arquivo Nacional pouco adiciona ao debate da transparência, do acesso à informação, da gestão de documentos eletrônicos, dos dados abertos. O arquivo nacional precisa mudar, clamam os participantes do movimento.
O movimento angariou, em 24 horas (foi lançado dia 11 de novembro último), mais de 800 seguidores no Facebook, além de 300 assinaturas no blog que traz o manifesto detalhado e as propostas que serão encaminhadas ao novo mandato presidencial. Em que pese não termos ainda uma prática pública de gestão da informação estratégica e operacional do governo, a alteração da gestão do AN já representaria um aceno à mudança, visto que é um órgão público parado no tempo e nas ideias.
Charlley Luz - Professor do curso de pós-graduação em Gestão Arquivística da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo). Membro do comitê Executivo do Movimento Muda Arquivo Nacional.